Quando recebemos grupos de visitantes aqui no Sítio Vale das Cabras para falar de educação ambiental, recorremos a perguntas como essas: o que é mais importante, um relógio ou um copo de água fresca? Um tênis novo ou um prato com comida gostosa? Estas perguntas em tom descontraído deveriam fazer parte, de forma bem séria, de todo o planejamento urbanístico de uma cidade. Afinal, como uma sociedade pode se alinhar ao desenvolvimento sustentável sem considerar o acesso universal à água limpa e à segurança alimentar como direito fundamental básico? Estamos falando de qualidade de vida como exercício ativo de cidadania.

Portanto, manter os serviços ecossistêmicos das zonas rurais é uma estratégia de sobrevivência para uma cidade. Lembram das aulas de geografia sobre cinturão verde? Pois é, tá na hora de colocarmos em prática este ensinamento.

Aprendemos que uma floresta em pé consegue manter um ciclo hidrológico altamente eficiente, constituindo-se em um enorme reservatório de água de chuva, carregando os lençóis freáticos, florescendo milhares de nascentes e nutrindo os rios da região com água limpa. Rios estes que são nossa fonte vital de abastecimento. Aí podemos entender a relação direta da crise hídrica de muitas regiões metropolitanas brasileiras com suas áreas rurais degradadas. Perdemos a capacidade ecológica para armazenar água de chuva no local, tudo escoa rapidinho para o oceano, levando os nutrientes do solo e assoreando os rios. 

Outros serviços ambientais da floresta é a conservação da biodiversidade, do clima e das características socioculturais do local. 

O potencial de impacto socioambiental positivo de um reflorestamento é tão amplo que esquecemos de incluir um serviço ecossistêmico super importante: a produção de alimentos agroecológicos, ou seja, alimentos saudáveis, sem agrotóxicos e que respeitam o solo e a cultura local. Estamos falando dos sistemas agroflorestais, técnica ancestral de consorciar espécies de árvores nativas com culturas agrícolas diversas. Numa mesma área é possível pensar floresta, frutas e hortaliças. Olha que fabuloso!

 O Brasil possui milhares de hectares de áreas degradadas que poderiam receber um programa de reflorestamento produtivo, cujo investimento é baixo e o retorno para a sociedade é alto. Este investimento pode vir dos programas públicos de reflorestamento ou do setor privado, como política corporativa de responsabilidade socioambiental.  É um modelo ganha-ganha, uma vez que ganha o produtor rural, muitos da agricultura familiar, que recebe a custo zero uma área de preservação e pronta para a produção agrícola. Ganha a cidade, pois aumenta seu abastecimento de água e alimentos saudáveis. Ganha a sociedade porquanto mantém a biodiversidade e a cultura do campo preservados. 

Aqui no Sítio Vale das Cabras começamos um projeto pioneiro em parceria com a Prefeitura de Campinas, em 2017. Recebemos o primeiro reflorestamento produtivo da cidade, uma inovação dentro do programa público do Banco de Áreas Verdes, destinado à compensação ambiental. São 5.000 m² de área de plantio, onde estão 1052 mudas de árvores nativas, sendo mais de 30 espécies diferentes. Consorciado ao plantio nativo, estão árvores frutíferas como laranjas, limões, tamarilos, bananas, mamões e outras espécies. Já plantamos e colhemos milho, mandioca, quiabo e batata doce, tudo fornecido para nosso CSA – Comunidade que Sustenta a Agricultura. É incrível a mudança da paisagem com apenas um ano de projeto, vivenciamos a força de regeneração da natureza. Mais culturas agrícolas ainda estão por vir.

 Aos poucos está surgindo uma área de refúgio ambiental que se conecta com nossa horta, gerando equilíbrio agroecológico para todo o sítio. 

Outro objetivo do projeto é a sua replicabilidade. Mostramos na prática os ensinamentos da permacultura. Já realizamos 6 oficinas agroflorestais e 4 dias de programa de voluntariado. Foram lindos dias de muito troca e aprendizados, sempre acompanhado de uma alimentação orgânica produzida aqui mesmo. 

 Estamos inseridos na Área de Proteção Ambiental de Campinas/SP, que corresponde a 35% do município, uma região de alta relevância ecológica. Infelizmente, hoje, representada por áreas rurais degradadas que perderam sua vocação produtiva e que sofrem com a pressão imobiliária. Queremos colaborar para que a agrofloresta se estenda por toda a APA, atingindo centenas de hectares, abastecendo Campinas com muita água e alimento de qualidade. Mais saúde e mais afeto para todos!